No alto, o ancoradouro Rio de Janeiro, vendo-se as docas da Alfândega, com os seus edifícios, a chaminé de sua casa de máquinas, o trapiche Maxwell, a praça 15 de Novembro e o casario existente até o antigo Arsenal de Guerra, na Ponta do Calabouço. A gravura menor mostra a Fortaleza de Santa Cruz, c.1880. (EB)

"CIDADE MARAVILHOSA"

Carlos Lessa

         A redescoberta do mar e da praia é um fenômeno extremamente importante para a cidade do Rio de Janeiro. Na Europa, até o século XVIII, acreditava-se que o oceano era o recipiente universal de todos os detritos e que fazia parte da natureza do mar rejeitar, sobre as praias, suas secreções e impurezas. Esta atividade purgativa do mar fazia da zona costeira uma área com miasmas e doenças. O resgate do mar e da praia começa quando o Iluminismo afirma que a beleza da Natureza atesta o poder e a bondade do Criador. Linneus, com a sua sistemática, revela o plano da Criação.
         O Rio de Janeiro, no século XIX, ao valorizar os altos e fugir da costa, fez o movimento de fuga tão intenso que o bonde puxado a burros já ligava, em 1859, a cidade ao Alto da Boa Vista, reservado para a residência de elites. A fuga da costa custava o esforço aos burros. A cirurgia de Pereira Passos introduziu um novo valor estético, com a redescoberta do mar: a avenida Central, com sua dupla perspectiva sobre a baía (Obelisco e a Praça Mauá) e a avenida Beira-Mar.
         O Rio no início do século XX teve nestas avenidas os seus espaços preferenciais de modernidade. Ao longo deste século o pestígio nômade caminhou das praias do interior da baía - Flamengo e Botafogo - para o oceano: Copacabana e, logo após, Ipanema e Leblon. Ao renegar a modernidade e sonhar com a "pós-modernidade", tende a deslocar o fulcro de esperança para a Barra da Tijuca.
         Esta foi uma operação extremamente bem-sucedida: o Rio como cartão de visitas do país e certidão de brasilidade, como lugar único que combinava a natureza tropical com a modernidade urbana, foi batizado Ville Merveilleuse pela francesa Jeanne Catulle Mendes, em 1912. Com a marcha de André Filho para o carnaval de 1935, consagrou-se o epíteto como "hino oficioso" da cidade. Aglutinador da variedade do país, o Rio é percebido pelos brasileiros como a síntese de características e potencialidades nacionais.

FONTE: Lessa, C. "O Rio de todos os Brasís", Record, 2/e, 2001. p.199, 15 e 13.

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