A BALADA DO RIO ANTIGO
Marília Carqueja
Ainda não vou te dizer o meu nome, sozinho irás aos pouco
descobrindo. Por isso, dá-me tua mão e vem passear por esta cidade
buscando vielas estreitas, ladeiras íngremes, praças tranqüilas,
igrejas imponentes e lugares acolhedores onde a sombra das árvores
forra o chão dos caminhos. Faremos uma ligeira parada para
respirares o calor tropical, amenizado pelo refrescante frescor do
balançar dos ramos.
Levar-te-ei a lugares por onde muitas vezes cruzaste sem te dares
conta dos encantos ali existentes. A paisagem é quebrada por árvores
frondosas onde cantam alegres cigarras. Isto sem falar das flores,
espalhadas pelos jardins, tocadas, levemente, por centenas de
borboletas coloridas.
Contar-te-ei histórias reais da época em que a cidade era
despertada, não pelo som estridente das buzinas mas, pelo trotar dos
cavalos puxando as carroças e, logo depois pelos pregões monótonos
dos ambulantes anunciando suas mercadorias: o verdureiro, o
vassoureiro, o peixeiro, o mascate e, ao cair da tarde, o
sorveteiro, que naquele tempo não empurrava um carrinho como agora,
vinha com seu caixote na cabeça, apoiado em rodilhas de pano,
cantando ingênuos versinhos de pé-quebrado: - Sorvete Iaiá, é de
coco e tem baunilha, sinhá !
Apreciaremos o mar, quebrando nas areias da praia; o recorte de
montanhas que nenhum escultor jamais teve talento para fazer; o
verde variado das encostas. Ao entardecer, a despedida dos pássaros:
Bem-te-vi, bem-te-vi, na primavera, nem tudo são flores. E, dentro
de umas duas horas, nascendo do mar, flutuará uma lua cheia.
Esta miscelânea de lugares e de sonhos ficará gravada em tua mente
e, com certeza, sentirás um infinito afeto por esta cidade
maravilhosa; pouco a pouco, tentarás redescobrir reminiscências de
imagens que seus olhos e ouvidos vislumbraram. Então, descobrirás o
nome da tua companheira de viagem que, certamente, já sabes: - eu
sou a saudade...
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